Tuesday, July 28, 2015

ÓPERA FERNÁLIA

 CRIAÇÃO Tânia Almeida, Joana Magalhães
DRAMATURGIA Cecília Ferreira, Rui Mendonça
MÚSICA Bernardo Soares, Ricardo Casaleiro, Vasco Ferreira
LUZ Vasco Ferreira
MOVIMENTO Joana Castro
CENOGRAFIA E FIGURINOS Catarina Barros
TRAILER André Martins
INTERPRETAÇÃO Catarina Santos, Gonçalo Fonseca, Isabel Carvalho, Joana Magalhães, Luís Filipe Silva, Mónica Tavares, Rui Mendonça, Sílvia Barbosa
 

DANÇA DA VIDA vs DANÇA DA MORTE
 
 Partimos da ideia de uma ficção televisiva, de uma telenovela transposta para um palco, com a possibilidade de brincarmos com o formato e os seus códigos. E pelo caminho encontrámos a Lulu personagem de O Espírito da Terra de 1895 de Frank Wedekind.
O que a Lulu nos trouxe foi um sentimento de voracidade, pela vida e o que ela contém, a vontade de vivê-la tão intensamente que só o indivíduo e os seus apetites e desejos importam, como se à vida na terra nenhuma outra se seguisse, live fast, die young.
É nesta dança da vida que seguimos Lulu acompanhados de um sentimento de impotência face ao real. O real que tantas vezes teima em estragar-nos a festa, sendo rude ou entediante, até ao ponto em que mesmo que venha com boas intenções lhe queremos barrar a entrada, It's my party and I cry if I want to.
E é nesta luta contra o tédio, o aborrecimento e o real que vamos dançando até chegar à dança da morte, onde tudo estranhamente parece começar a ter significado. A vida encarada como momentos, flashes, sequências coladas umas às outras, que em final de balanço nos fazem pensar tanto barulho por nada e tudo a caminhar em direção ao letreiro The End.
Por isso há que aproveitar o silêncio enquanto temos salão.
Dancemos pois!
Tânia Almeida

MUTANTES

WORKSHOP DE FORMAÇÃO ARTÍSTICA PARA JOVENS
 Um projeto que envolveu artistas e grupos de jovens adolescentes. Ao longo de uma semana o grupo acompanhado por um artista construiu uma instalação a partir de um olhar sobre um lugar.  
 
ARQUITETURA 
 
ESCULTURA

LOMOGRAFIA
 
PINTURA
 
MÚSICA

LENDAS DO ALTO MINHO

 
 
 
RE-VERSO
a partir das lendas
A Nossa Senhora da Pegadinha e O Peregrino das Fontaínhas
 
 
 
O PENEDO
a partir das lendas
Flor do Montes, Rio de Âncora e Serra de Arga
 
 
 
MAGNÍFICOS
a partir das lendas
Mal Degolada, Pieira de Lobos, Serra da Nó, Unhas do Diabo, Galgo Preto, Rio Lima, Cabração, Santa Comba, Três Penedos e o Rego do Azar
 
 
 
BARTOLOMEU 5.0
a partir da lenda
das Cinco Badaladas
 
 
 
 
LENDAS DA NOSSA TERRA
a partir das lendas
Juiz do Soajo, Moura de Giela, Senhora da Peneda e Poço da Olá
 
 
  
PRIMARCKA
a partir das lendas
Fonte dos Porcos, Cova da Moura e Cervo Rei
 
 
 
TERRA
 a partir das lendas
O Morto Vivo, Mudança de Marcos, As Bruxas do Caminho de Melim, A Rainha Aragunta, O Monge e O Passarinho
 
 
SENHORA DOS MILAGRES
a partir da lenda
da  Igreja dos Milagres
 
 
 
FREI JOÃO DA CRUZ - O MUSICAL 
a partir da lenda
Frei João da Cruz
 
 
 
ANOITECEU
a partir das lendas
O Pretinho do Cruzeiro, O Campo da Fome, São Bento da Porta Aberta e Os Combates da Travanca
 
 
 
* Atividade promovida pela CIM Alto Minho, no âmbito do projeto Criarte

Tuesday, April 21, 2015

CADERNO NÃO LUGAR

Textos retirados de
NÃO-LUGARES de Marc Augé e do LIVRO DO DESASSOSSEGO de Bernardo Soares

 
Cena 1
Prólogo
H – Antes de ir buscar o automóvel, Pierre Dupont quis levantar dinheiro na caixa automática. O aparelho aceitou o seu cartão e autorizou-o a levantar 200 euros. Pierre Dupond carregou na tecla. O aparelho pediu-lhe que esperasse um instante, depois entregou-lhe a soma estabelecida, lembrando-lhe que retirasse o cartão.
M – “Obrigada pela sua visita”
H – Concluiu, enquanto Pierre Dupond guardava as notas na carteira.
M – O trajeto foi fácil: Descer para Paris pela autoestrada A11 não é problema numa manhã de Domingo. Não teve de esperar à entrada, pagou com o cartão de crédito na portagem de Dourdan.
H – “Obrigado, e boa viagem”
M – Contornou Paris pelo periférico e chegou a Roissy pela A1.
H – Estacionou na segunda cave.
M – J15
H – Enfiou o cartão de estacionamento na carteira, depois apressou-se para os balcões do Check in da Air France. Desembaraçou-se com alívio da mala.
M – Vinte quilos certos.
H – Estendeu o bilhete à hospedeira perguntando-lhe se podia ter um lugar de fumador na coxia. Silenciosa, ela assentiu com um sinal de cabeça, depois de ter consultado o computador entregou-lhe a seguir o bilhete e o cartão de embarque.
M – “Embarque na porta B às 18 horas.”
H – Precisou sorridente.
M – Apresentou-se um pouco mais cedo no posto de controlo da polícia para passar ainda pela loja duty-free. Comprou uma garrafa de Cognac .
H – “Uma recordação de França para os seus clientes asiáticos.”
M – E uma caixa de charutos.
H – “Para seu consumo pessoal.”
M – Teve o cuidado de guardar a fatura juntamente com o cartão de crédito. Percorreu por um momento com o olhar as montras luxuosas. Parou na livraria, folheou algumas revistas antes de escolher um livro fácil e retomou depois sem impaciência o seu passeio.
H – Saboreava a impressão de liberdade que lhe davam ao mesmo tempo o facto de se ter desembaraçado da sua bagagem e, mais intimamente, a certeza de apenas ter de esperar a sucessão dos acontecimentos. Agora que se pusera em regra, enfiara no bolso o seu cartão de embarque e declinara a sua identidade.
M – Não seria hoje nos lugares superpovoados onde se cruzavam ignorando-se milhares de itinerários individuais que subsistiria qualquer coisa do encanto incerto dos terrenos vagos, dos baldios e dos estaleiros, dos cais de gare e das salas de espera onde os passos se perdem, de todos os lugares de acaso e de encontro onde se pode experimentar fugidiamente a possibilidade mantida da aventura, a impressão que bastará ver o que aí vem.
H – O embarque fez-se sem problema. Os passageiros cujo cartão de embarque tinha a letra Z foram convidados a apresentar-se depois dos outros e ele assistiu com certo divertimento ao leve e inútil atropelo dos x e dos Y à saída da manga.
M – Enquanto esperava a descolagem e a distribuição dos jornais, folheou a revista da companhia e imaginou com um dedo aplicado o itinerário possível da viagem.


H – Heraklion, Larnaka, Beirute, Dharan, Dubai, Bombain, Banguecoque.
M – Mais de nove mil quilómetros num abrir e fechar de olhos e alguns nomes que, de tempos a tempos, davam que falar como temas da atualidade.
H – Relanceou a tarifa de bordo isenta de taxas.
M – “Duty free price list.”
H – Verificou que os cartões de crédito eram aceites nos voos de longo curso, leu com satisfação as vantagens que apresentava a classe de negócios das quais a generosidade inteligente da sua empresa o fazia beneficiar.
M – “Em Charles de Gaulle 2 e em Nova Iorque os salões Le Club permitem-lhe descontrai-se, telefonar, enviar um fax ou um minitel.”
H – “O Minitel é um serviço de videotexto criado em França em 1982, percussor da internet, o Minitel permitia a troca de mensagens e o acesso a serviços de informação.”
M – “Além de um acolhimento personalizado e de uma atenção constante , o novo assento Espace 2000 que equipa os voos de longo curso foi concebido de modo a tornar-se mais largo, com um espaldar e um apoio para a cabeça que se podem ajustar separadamente.”
H – Prestou um momento de atenção ao comando com painel digital do seu banco Espace 2000 e voltou depois a mergulhar nos anúncios da revista, admirando o perfil aerodinâmico de alguns modelos de estrada recentes, algumas fotografias dos grande hotéis de uma cadeia internacional, um tanto pomposamente apresentados como “os lugares da civilização.”
M – Depois, descobriu o anúncio de um automóvel que tinha o mesmo nome que o seu lugar de bordo.
H – “ Renault Espace, um dia, a necessidade de espaço faz-se sentir. A vontade irresistível de termos um espaço próprio, um espaço móvel que nos levasse longe. O espaço está já consigo, nunca se esteve tão bem em terra, como no Renault Espace.”
M – Estavam já a descolar. Folheou mais rapidamente a continuação, concedendo alguns segundos a um artigo sobre o hipopótamo, senhor do rio, que começava com uma evocação a África.
H – “Berço das lendas, continente da magia e sortilégios.”
M – Deu uma olhadela a uma reportagem sobre Bolonha.
H – “Em toda a parte podemos estar apaixonados, mas em Bolonha, apaixonamo-nos pela cidade.”
M – Um anúncio em inglês de um videomovie japonês despertou-lhe a atenção por um instante…
H – “Vivid colors, vibrant sound, and nonstop action. Make them yours forever.”
M – Pelo brilho das suas cores.
H – Um anúncio do cartão visa tranquilizou-o de vez.
M –“ Aceite no Dubai e onde quer que vá de viagem. Viaje com a máxima confiança com o seu cartão Visa.”
H – Relanceou distraidamente algumas recensões de livros e deteve-se um instante, por interesse profissional, na que resumia uma obra intitulada Euromarketing.
M – “A homogeneização das necessidades e dos comportamentos de consumo faz parte das tendências pesadas que caracterizam o novo meio ambiente internacional da empresa. A partir da incidência do fenómeno da globalização sobra a empresa europeia, sobre a validade e o conteúdo de um euromarketing e sobre as evoluções previsíveis do meio ambiente marketing internacional, numerosas questões se debatem.”
H – A recensão evocava, como remate.
M – “As condições propícias ao desenvolvimento de um mix o mais estandardizado possível. A arquitetura de uma comunicação europeia.”
H – Um tanto sonhador, Pierre Dupont pousou a revista. A inscrição fasten seat belt apagara-se. Ajustou os auscultadores, escolheu o canal 5 e deixou-se invadir pelo adagio do concerto nº 1 de Haydn. Durante umas horas, o tempo de sobrevoar o Mediterrâneo, o Mar Ar estaria enfim só.


Cena 2
A Descoberta

Cena 3
Desembarcar em Bordéus
H - O único viajante com verdadeira alma que conheci era um garoto de escritório que havia numa outra casa, onde em tempos fui empregado. Este rapazito colecionava folhetos de propaganda de cidades, países e companhias de transportes; tinha mapas – uns arrancados de periódicos, outros que pedia aqui e ali – Tinha, recortadas de jornais e revistas, ilustrações de paisagens, gravuras de costumes exóticos, retratos de barcos e navios. Ia às agências de turismo, em nome de um escritório hipotético, ou talvez em nome de qualquer escritório existente, possivelmente o próprio onde estava, e pedia folhetos sobre viagens para a Itália, folhetos de viagens para a India, folhetos dando as ligações entre Portugal e Austrália.
Não só era o maior viajante, porque o mais verdadeiro, que tenho conhecido: Era também uma das pessoas mais felizes que me tem sido dado a encontrar. Tenho pena de não saber o que é feito dele, u, na verdade, suponho somente que deveria ter pena; Na realidade não a tenho, pois hoje, que passaram 10 anos, ou mais, sobre o breve tempo em que o conheci, deve ser homem, estúpido, cumpridor dos seus deveres, casado talvez, sustentáculo social de qualquer – morto, enfim, em sua mesma vida. É até capaz de ter viajado com o corpo, ele que tão bem viajava com a alma.
Recordo-me de repente: Ele sabia exatamente por que vias férreas se ia de Paris a Bucareste, por que vias férreas se percorria a Inglaterra, e, através das pronúncias erradas dos nomes estranhos, havia a certeza aureolada da sua grandeza de alma. Hoje, sim, deve ter existido para morto, mas talvez um dia, em velho, se lembre como é não só melhor, senão mais verdadeiro, o sonhar com Bordéus do que desembarcar em Bordéus.
Cena 4
Super(mercado)
 
M - Só, mas semelhante a quase todos os outros. Ele circula silenciosamente, consulta as etiquetas, pesa os legumes numa máquina que lhe indica o peso e o preço. A existência do contrato é-lhe ocasionalmente lembrada, o bilhete do estacionamento, a senha que deverá apresentar no Talho, ou até o carrinho que empurra à sua frente pelos corredores são outras tantas marcas da sua presença. A rádio faz publicidade às grandes superfícies; as grandes superfícies publicidade à rádio, os cartões, os descontos as marcas e as promoções fazem com que ele, semelhante aos outros, se ache assim apanhado nos ecos e nas imagens de uma espécie de cosmologia universal. Desenham um mundo que qualquer um pode fazer seu porque é nele incessantemente interpelado. A tentação do narcisismo é, aqui, ainda mais fascinante pelo facto de parecer exprimir a lei comum: Fazer como os outros para ser o próprio. Depois ele estende o cartão de crédito a uma mulher nova, também ela silenciosa, que submete cada artigo ao registo de uma máquina descodificadora antes de verificar o bom funcionamento do cartão de crédito. Diálogo direto, mas silencioso. Insere o cartão e no ecrã são transmitidas instruções, de um modo geral encorajadoras, por vezes verdadeiras chamadas à ordem. As palavras aqui quase deixam de intervir. Ele, leva uma sociedade inteira dentro de si. Ninguém tem uma personalidade tão acusada como aquele que leva no seu interior mais dos outros, que une e concentra o que é dos outros, que tem mais de todos. Mas o que de melhor ocorre aos homens é o que lhes ocorre quando estão sozinhos, aquilo que não se atrevem a confessar, muitas vezes a si mesmos, aquilo de que fogem, aquilo que encerram em si quando estão em puro pensamento, antes de que possa florescer em palavras.


Cena 5
Enfim só

Cena 6
Não Lugar
Cena 7
A Paisagem
H - A ideia de viajar nauseia-me.
Já vi tudo que nunca tinha visto.
Já vi tudo o que ainda não vi.
O tédio do constantemente novo, o tédio de descobrir, sob a falsa diferença das coisas e das ideias, a perene identidade de tudo, a semelhança absoluta entre a mesquita, o templo e a igreja, a igualdade da cabana e do castelo.
Paisagens são repetições. Numa simples viagem de comboio divido-me inútil e angustiadamente entre a inatenção à paisagem e a inatenção ao livro que me entreteria se eu fosse outro. Tenho da vida uma náusea vaga e o movimento acentua-ma.
Só não há tédio nas paisagens que não existem.
Ah, viajem os que não existem! Mas aos que pensam e sentem, aos que estão despertos, a horrorosa histeria dos comboios, dos automóveis, dos navios não os deixa dormir nem acordar.
De qualquer viagem, ainda que pequena, regresso como de um sono cheio de sonhos, uma confusão tórpida, com as sensações coladas umas às outras, bêbado do que vi.
Só não há tédio nas paisagens que não existem.
não há tédio nas paisagens que não existem.
Só não há tédio nas paisagens que não existem.

Cena 8
Viajantes solitários

Cena 9
A partida

H - Ele traça um itinerário, enuncia os nomes correspondentes, não conhece necessariamente grande coisa a seu respeito. Mas os nomes por si só bastarão para produzir no lugar essa erosão ou não-lugar que nele escava a lei do outro. Todo o itinerário é desviado pelos nomes que lhe dão sentido ou direções até então imprevisíveis. A viagem constrói uma relação fictícia entre olhar e paisagem.
M -  Ele experimenta-se como espectador sem que o espetáculo para ele conte realmente. Como se ele, em posição de espectador fosse para si mesmo o próprio espetáculo. Este olhar, a imagem de rostos curiosos ou contemplativos, solitários ou reunidos, que perscrutam o infinito do oceano, a cadeia circular de montanhas nevadas ou a linha de fuga de um horizonte urbano repleto de arranha-céus, não fala senão dele.
H - Assaltado pelas imagens, faz a experiência simultânea do presente perpétuo e do encontro consigo. A evocação profética de espaços onde nem a identidade, nem a relação, nem a história fazem verdadeiramente sentido, em que a solidão se experimenta como superação ou esvaziamento da individualidade, em que só o movimento das imagens deixa entrever, por instantes, àquele que as vê fugir, a hipótese de um passado e a possibilidade de um futuro.
M -  Um dia, talvez, de um outro planeta, virá um sinal. E o conjunto do espaço terrestre tornar-se-á um lugar. Ser terreno significará alguma coisa. É no anonimato do não-lugar que se experimenta solitariamente a comunidade dos destinos humanos. Haverá espaço amanhã, talvez já hoje haja espaço para uma etnologia da solidão.
 

TUDO SE TRANSFORMA

CRIAÇÃO Rui Mendonça
CO CRIAÇÃO E INTERPRETAÇÃO Tânia Almeida e Wendy
CENOGRAFIA Rita Nicolau
MÚSICA ORIGINAL Vasco Ferreira